Mais da metade dos chilenos, 54% dos entrevistados antes da conclusão do texto preliminar nesta semana, planeja votar contra a nova Constituição, segundo a empresa de pesquisas Cadem.
Catalina Lagos, membro de uma comissão de especialistas que revisará a minuta a partir de sábado, diz que o texto "não reflete a sociedade chilena como um todo, mas apenas um setor político".
Lagos diz que ainda há tempo para moderar a Constituição proposta e a consultoria Teneo advertiu que "todo o processo pode entrar em colapso" antes do referendo de dezembro, caso o conselho se recusar a aceitar as mudanças da comissão de especialistas.
Desta vez, um conselho constituinte é dominado por membros mais à direita, depois que a primeira tentativa foi rejeitada pelos chilenos em um referendo em setembro de 2022.
O texto anterior, elaborado em grande parte por políticos de esquerda, teria sido uma das cartas mais progressistas do mundo, mas foi igualmente criticado por não representar a sociedade como um todo.
O pêndulo ideológico sugere que muitos chilenos estão fundamentalmente desconfortáveis com os extremos de ambos os lados, menos de dois anos após o início da Presidência do esquerdista Gabriel Boric.
Lagos, que também ajudou a redigir a primeira tentativa, diz que o pêndulo se moveu na outra direção.
O primeiro texto permitia "a interrupção voluntária de uma gravidez". A proposta atual faz uma mudança gramatical em uma cláusula constitucional que os defensores do aborto já consideram restritiva. Ela se referiria ao nascituro por um pronome pessoal em vez do impessoal atual.
O conselheiro Antonio Barchiesi, do Partido Republicano, de extrema-direita, disse que "o escopo legal da norma atual não muda", mas afirma que a mudança é para destacar que "há alguém" no centro da cláusula.
Lagos, no entanto, diz que essa mudança, combinada com outra proposta que definiria uma criança como qualquer ser humano com menos de 18 anos, poderia abrir caminho para leis de aborto mais restritivas.
Com o direito à interrupção voluntária da gestação se ampliando em grande parte da América Latina, sendo os mais recentes o México e a Argentina, os defensores do direito ao aborto estão preocupados com a possibilidade de que um ressurgimento da direita na região possa interromper o progresso ou fazer com que os direitos retrocedam.
Em um comício em comemoração ao dia global de ação pelo acesso ao aborto seguro e legal na semana passada em Santiago, a estudante Isadora Calderón, de 26 anos, disse à Reuters que achava que o direito ao aborto estava sendo ameaçado pelas propostas atuais.
"Se um partido quer redigir uma Constituição com certas diretrizes, quem disse que eles não farão isso no futuro com leis?", indagou.
Agustina Ramón Michel, advogada argentina do consórcio latino-americano contra o aborto inseguro (Clacai), disse que outros países da região estão observando o Chile de perto.
"Estamos tendo uma reação contrária à Constituição anterior, que muitos também disseram que não os representava, que estava indo muito para um lado ou para outro, e agora estamos tendo o oposto", disse Ramón Michel.
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Com informação da Agência Brasil