A Santa Casa de Misericórdia de Goiânia suspendeu todos os atendimentos eletivos (consultas, exames e cirurgias) nesta terça-feira (19). A paralisação faz parte de um movimento nacional das mais de 2 mil Santas Casas brasileiras e tem como objetivo alertar para a possibilidade de fechamento definitivo das unidades de saúde.
A principal reivindicação diz respeito aos valores repassados pelo Ministério da Saúde (MS) já que 95% do atendimento prestado pela Santa Casa de Goiânia envolve pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS). Superintendente geral do hospital, Irani Ribeiro de Moura explica que não se trata de uma greve, mas é uma espécie de pedido de socorro e os atendimentos que estavam agendados foram remarcados. Ainda assim, alguns pacientes, inclusive do interior do estado, chegaram à unidade e afirmam que não foram comunicados.
Por ano, a discrepância entre os valores pagos e os gastos das unidades filantrópicas ultrapassam R$ 10,9 bilhões. Desde o início do plano real, há 28 anos, a tabela do SUS foi reajustada em média em 93,77%. Para se ter uma ideia da defasagem: neste mesmo período o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) subiu 636,07%, o salário-mínimo 1.597,79% e o gás de cozinha 2.415,94%.
Consultas a R$ 10
“A Santa Casa de Misericórdia de Goiânia é responsável por mais 70% do atendimento do SUS na capital. Somos o hospital de alta complexidade do município e trabalhamos para oferecer um atendimento de qualidade, pois a população merece ser bem atendida”, diz, ressaltando que, em contrapartida, a Santa Casa recebe do SUS R$ 10 por uma consulta médica.
A defasagem nos valores pagos fez a unidade filantrópica de Goiânia recorrer a empréstimos bancários e, consequentemente, aumentado o seu endividamento, para tentar fechar as contas mensais.
Reajuste de medicamentos e atraso no repasse
A Santa Casa afirma que durante a pandemia o reajuste de medicamentos foi muito grande e que houve situações em que o preço saltou de R$ 1,90 para R$ 245,00. Além disso, afirma que há atraso nos repasses dos pagamentos pela Secretaria Municipal de Saúde (SMS). Em nota, a unidade diz que o Governo Federal repassa os valores aos municípios 60 dias após a prestação dos serviços, mas, em Goiânia, os repasses ao hospital estão demorando mais de 100 dias.
“E todos os casos cirúrgicos que chegam judicializados à Secretaria Municipal de Saúde de Goiânia são encaminhados à Santa Casa, sendo que nem todos temos condições de atender”, diz a superintendente, ressaltando que já comunicou esse fato à SMS, mas os encaminhamentos continuam sendo feitos.
A SMS foi procurada pelo O Popular, mas não respondeu até o fechamento desta matéria. O espaço permanece aberto para resposta.
SUS é tripartide
A superintendente afirma que a Santa Casa de Goiânia está trabalhando acima da capacidade e que está cofinanciando o SUS, quando deveria acontecer o contrário. Para ela, se não houver políticas imediatas e consistentes e investimentos dos Governos Federal, Estaduais e Municipais nos hospitais filantrópicos, eles dificilmente vão sobreviver, deixando milhões de brasileiros sem assistência.
“É preciso rever a tabela do SUS e é preciso também mais investimento por parte dos Governos Federal, Estaduais e Municipais, afinal o SUS é um sistema tripartite e o fechamento dos hospitais filantrópicos provocaria um caos na saúde pública”, afirma Irani Ribeiro de Moura.
800 atendimentos diários
Diariamente cerca de 800 pessoas são atendidas na Santa Casa e, segundo a unidade, desde a semana passada, os pacientes com atendimentos previstos para esta terça-feira (19) teriam sido comunicados sobre a nova data, 27 de abril. Ainda assim, pacientes vieram do interior do Estado e afirmam que não foram comunicados com antecedência.
Ruimar Pereira Borges, de 69 anos, saiu de Cristalina 1h30 desta terça-feira (19). O agendamento dele estava marcado desde outubro de 2021 e afirma que não foi comunicado da paralisação. Depois de percorrer quase 400 km de ônibus, foi avisado na recepção sobre a movimentação nacional. “Fazer o quê? Agora é aguardar né? Saí 1h30, cheguei em Goiânia 5h e agora vou retornar pra casa sem ser atendido”, completa.
Leandro Silveira da Cruz, de Jataí, também chegou à unidade e foi comunicado sobre a paralisação. “Tem seis meses que estou aguardando para um cardiologista e agora fui comunicado. Ainda estou com dengue. Saí de lá pra vir fazer minha consulta com dengue e quando chego aqui me deparo com essa situação”.
“Pode ter havido casos que o hospital não conseguiu avisar e a Santa Casa pede desculpas aos pacientes, mas nenhum ficará sem atendimento. Hoje, apesar da manifestação que atinge os atendimentos eletivos - exames, consultas, cirurgias não agendadas para a data -, outros procedimentos, como oncologia, emergência, banco de sangue, hemodiálise e cirurgias que já tinham sido marcadas, estão normais. Teve um paciente que veio de Jataí, sem saber da paralisação, mas a consulta dele foi remarcada para ainda hoje, às 14 horas”, disse, em nota, a instituição.