13/05/2023 às 10h37min - Atualizada em 13/05/2023 às 10h37min

Goianês: As particularidades do falar goiano

Um ​cafézim ​para receber as visitas e uns ​biscoitim ​de queijo para acompanhar é um ​trem bão demais da conta, sô?!  Para quem não é da terrinha, esse jeitinho de falar, assim, colocando tudo no diminutivo, misturando plural com singular e se referindo à quase tudo como ‘trem’ pode causar alguma estranheza.

Aliás, enquanto se ignora o ‘s’ do plural, o ‘r’ ganha destaque na pronúncia em terras goianas. O professor de inglês Renner Lacerda, de 22 anos, gosta de brincar com seu sotaque. “Eu tenho orgulho de falar puxando o ‘r’, na verdade, às vezes eu até forço, é proposital mesmo, para ficar mais acentuado ainda”, afirma aos risos.

Esse jeitinho de falar já ganhou até dicionário próprio com algumas expressões, para facilitar aos turistas se familiarizarem com o goianês e, quem sabe, arriscar em usar algumas delas durante uma prosa. Usar expressões do tipo ​queijim​, para se referir a uma rotatória no trânsito ou, caso sinta fome, saber o que é um Pit Dog e ainda aprender a usar as gírias corretamente para não dar “rata”.

O estudante Axel Miguez, de 25 anos é espanhol, mas vive em Goiânia desde sua adolescência. Para ele o goianês é algo curioso, pois o sotaque e o estilo de falar se difere de outras regiões do Brasil. “​A diferença é notável dos sotaques pelo país. Essa variação não é algo que percebo tanto na Espanha ou na Argentina, quando vou visitar meus parentes”, disse Axel.

Apesar de ainda ter sotaque espanhol, Axel gosta do goianês. “Porque é uma mistura de uma coisa inocente do interior, meio rústico, mas ao mesmo tempo é bonito, é simples”, declara e complementa dizendo que usa as expressões tipicamente goianas. “Entendo tudo perfeitamente, a minha dificuldade é para falar. Mas mesmo com o sotaque gringo, eu gosto muito de falar ‘uai’, ‘trem’, ‘que nem’, no meu dia a dia”.

Durante uma viagem à Florianópolis, o Axel conta que passou por uma situação que o marcou pelo uso de seu ‘goinol’, como ele mesmo define a mistura do goianês com espanhol. “Estava em numa fila para comprar lanche e dois rapazes atrás de mim comentavam, meio que reprovando a atitude de duas garotas que estavam no início da fila. Elas estavam em uma conversa que não era pra idade delas. Aí eu virei e mesmo com meu sotaque espanhol, o goiano de dentro de mim soltou: Tem base um trem desse não!’. Os caras ficaram olhando para mim sem entender ao certo o que aquilo significava.  

Renner Lacerda também já passou por algumas situações em que sua maneira de falar chamou atenção. Por ser professor de inglês, Renner mantém contato com pessoas de diversas localidades. Durante a aula com uma carioca, ele deixava escapar um ​sô​, trem custoso​, ​bão demais e o inevitável ​uai ​no final das frases. “​Ela não aguentou e começou a rir. Depois da aula, conversamos sobre as coisas daqui de Goiânia, ela ficou curiosa e apesar de ter achado engraçado, também achou charmosinho”, relembra Renner.

Segundo a professora de história da UFG, Cristina de Cássia, a fala do goiano tem marcas do interior, apesar da urbanização, isso devido à forma como a região foi ocupada. “O interesse em Goiás surge no período da busca por ouro, então bandeirantes vieram para cá. Além disso, essa região era passagem de tropeiros, o que também influenciou”, declara a historiadora.

Usar uma linguagem sem muitas formalidades, de acordo com Cristina, também é algo ligado à herança histórica de Goiás. “O goiano gosta de puxar conversa com todo mundo e o tratamento com o outro é bastante pessoal, a ponto de levar em casa para um cafezinho. Por isso se encurta as palavras, usa-se o diminutivo, essa é uma forma de se criar um vínculo maior”, explica.

A professora de história também lembra que já passou por algumas situações em que usou expressões que não eram usuais para as pessoas ao seu redor. “Foi em uma viagem, eu falava pra pessoa pegar o ‘trem’ que eu queria em cima da mesa, depois usei o ‘tremzinho’ em outro contexto, me referia à uma criança". Cristina continua: “Os pessoal ao meu redor acharam engraçado eu usar o ‘trem’ para tudo e qualquer coisa e em momentos completamente distintos”.


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