Um dos criadores do coletivo, o jovem jornalista Gilberto da Silva, de 24 anos de idade, nasceu e foi criado na comunidade. Cresceu também frequentando a igreja junto com a família, tanto que colaborava na comunicação dos religiosos. Foi fazer jornalismo para contar a história do lugar simples “que ama”.
O coletivo conta atualmente com 70 integrantes. Já foram mais de 50 matérias, além das mais de 1.000 postagens em redes sociais.
Ele classifica como desinformação o processo de criminalização da periferia. Havia, pois, muito a comunicar. O auge desse incômodo foi durante a pandemia da covid-19, quando mensagens negacionistas rodavam a comunidade, como ataques à vacinação.
“Quando chegávamos em nossa comunidade, todo mundo estava sem máscara como se não tivesse pandemia. A comunicação foi e tem sido uma articuladora para que outros projetos de comunidade possam surgir”, disse. Como é o caso do trabalho em saúde.
Uma das moradoras voluntárias do coletivo é a enfermeira Joselma Carvalho, de 52 anos de idade. Ela presta atendimento dentro da comunidade e auxilia os moradores para tirar dúvidas. “Desde que era técnica de enfermagem, procuro passar informações corretas e orientar os moradores para atendimento”, disse a profissional de saúde.
Gilberto Silva lembra que a desinformação, que estava “correndo solta” durante a pandemia, foi a motivação para criar um conselho de comunicação comunitária para se defenderem. “Os próprios moradores se chamam de sargentinos, tal é a identificação que a comunidade tem com o lugar em que moram”, disse. Para o coletivo organizar as ações, realiza, independentemente do IBGE, um censo para buscar informações sobre a comunidade.
Também é criadora do coletivo a jornalista Marthiene Oliveira, de 33 anos de idade, que nasceu no bairro da Linha do Tiro, onde está a comunidade do Córrego do Sargento. Ela acrescenta que o levantamento busca ouvir os moradores sobre as principais dúvidas do dia a dia, incluindo as vulnerabilidades. Ela avalia que a igreja também tem um papel muito importante para a comunidade. “A igreja é um ponto de encontro, de fé e de reunião da nossa comunidade”.
Pelo coletivo e na igreja, conversam sobre os principais desafios da comunidade, como infraestrutura urbana e educação. “Como a gente está falando de favela, a gente precisa de letramento racial. Havia pessoas que não se enxergavam como pretas, vendo como se fosse algo negativo. A comunidade é preta, 90% pelo menos”. A jornalista comunitária entende que a desinformação é um desafio permanente que precisa ser enfrentado.
Outro enfrentamento à desinformação é realizado pelo Coletivo Bereia, no Rio de Janeiro. O projeto nasceu das pesquisas realizadas na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a partir de 2016, quando se observava a circulação de desinformação em ambientes religiosos, especificamente cristãos e evangélicos, na área da saúde. O coletivo conta com 17 voluntários e produz cerca de 12 reportagens por mês.
“Com a pesquisa, nós ficamos muito surpreendidos com os resultados com um alto número de circulação de conteúdo falso, enganoso, em grupos religiosos. E ficamos alarmados”, disse a editora geral Magali Cunha. Ela é doutora em Ciências da Comunicação e pesquisadora do Instituto de Estudos da Religião (Iser).
A partir disso, pesquisadores em jornalismo resolveram criar o projeto, que inspirado em agências de checagem no Brasil, buscaram se dedicar especificamente à circulação em grupos de igrejas. O Bereia foi criado em 2019 com trabalho voluntário.
“O trabalho é feito com um respeito muito grande, justamente identificando que os grupos religiosos são os maiores alvos da desinformação que circula com mais intensidade. Buscamos fazer prestação de serviço a esses grupos, para que eles possam perceber como se tornam alvos da indústria da desinformação”, explica a editora e pesquisadora.
De outra forma, a pesquisadora em teologia e pastora Wall Moraes, de 65 anos de idade, de Brasília, tem atuado também para reduzir os processos de desinformação. Ela fez parte da criação do programa Superando a História Única que tem por objetivo dar visibilidade social a pastoras e pastores com olhar afirmativo e inclusivo. “Esse programa foi fundamental porque nós recebemos vários retornos de protestantes progressistas que estavam em regiões onde estavam sendo atacados por suas visões”.
Para ela, o principal desafio pós-pandemia é orientar para o fato que os púlpitos de organizações religiosas não sejam utilizados com viés político-partidário e também que espalhem desinformações, levando em conta que pesquisas mostram que pessoas pretas de periferia são mais afetados e por isso precisam não serem vítimas de mentiras que circulam.
A pesquisadora adianta que um grupo inter-religioso, do qual ela faz parte, está elaborando uma cartilha de orientação a membros de qualquer igreja. Esse material abordará temas como a tolerância religiosa e a conduta para buscar informações de qualidade. A previsão é que o lançamento seja no dia 30 de novembro.
Com informação da Agência Brasil