O caso abriu uma crise política que levou à demissão do secretário de Crianças e Adolescentes do Ministério do Capital Humano, Pablo De la Torre, apontado como responsável pela distribuição dos mantimentos.
Em nota, o ministério de Pettovello afirmou que foi aberta auditoria para investigar o caso dos alimentos próximos do vencimento e culpou funcionários por “não ter realizado um controle permanente de estoque e vencimento de mercadorias”.
A crise política tem início com a falta de repasses para os comedores comunitários. Nos últimos dias, ao menos 32 deles anunciaram o fim da distribuição de alimentos por falta de repasses do governo. Estima-se que os restaurantes fechados alimentavam mais de 8 mil pessoas em situação de pobreza em Buenos Aires.
A associação civil Rede de Apoio Escolar e Educação Complementar (ERA) atendia mais de 3 mil crianças e adolescentes com alimentos gratuitos, mas foi obrigada a fechar os 13 comedores que mantinha.
“É um desastre porque as crianças vão no contraturno aos nossos centros. Muitas vezes nas escolas não há comedores. Era a única comida de qualidade que tinham por dia”, afirmou Margarita Zubizarreta, representante da organização em entrevista à rádio local La Patriada. Segundo ela, a associação faz esse trabalho há mais de 30 anos.
De acordo com a organização Rede de Infância, Adolescência e Educação Popular (Interredes), existem 183 instituições que distribuem alimentos gratuitos para mais de 20 mil pessoas e que estão com risco de fechar as portas por falta de repasses do governo.
“A fome é um crime. Exigimos o repasse imediato dos recursos e a entrega da mercadoria necessária para garantir o funcionamento de todos os comedores comunitários”, disse a Interredes, em comunicado.
Na última semana, o juiz federal argentino Sebastián Casanello determinou a distribuição, em 72 horas, de cinco toneladas de alimentos, mas o governo recorreu da decisão sem cumprir a liminar.
O governo Milei acusa essas organizações de serem “comedores fantasmas”, diz que os alimentos armazenados são para situações de emergência – como catástrofes ambientais – e defendeu que a decisão judicial é “um avanço ilegítimo da Justiça sobre a democracia que viola a divisão de poderes”.
O Judiciário respondeu a uma demanda do dirigente social Juan Grabóis, que rebate os argumentos do governo, dizendo que eles usam uma base de dados desatualizada para acusar os restaurantes de “fantasmas”.
Os repasses aos comedores populares fazem parte do Plano Nacional Argentina Contra a Fome, que recebe fundos do programa Abordagem Comunitária, do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud).
Um estudo da Universidade Católica Argentina mostrou que a pobreza no país atingiu o maior nível em 20 anos em janeiro de 2024, quando 57,4% da população argentina vivia abaixo da linha da pobreza.
Isso equivale a 27 milhões de pessoas, de um total de 46 milhões de habitantes. A extrema pobreza também cresceu: de 14,2% em dezembro para 15% em janeiro. De acordo com a Reuters, argentinos buscam alimentos descartados para sobreviver.
A inflação na Argentina tem desacelerado desde dezembro do ano passado, apesar de continuar alta. A taxa anual chegou à cerca de 289% em abril deste ano no acumulado de 12 meses, segundo índice oficial do Ministério da Economia Argentina.
O ultradireitista Javier Milei tem defendido, desde que assumiu o governo no final de 2023, o corte dos investimentos e gastos do Estado como forma de estabilizar a economia. Essa estratégia, elogiada por agentes do mercado financeiro, é criticada por economistas heterodoxos, que acusam o governo de transferir o peso da crise para os mais pobres, que dependem de ajuda estatal.
Com informação da Agência Brasil