O Marco Legal das Garantias chegou para atualizar as regras para o uso de bens como garantia em negociações - Freepik Sancionada no final do ano passado, a Lei Federal 14.711 de 2023, conhecida como Marco Legal das Garantias, chegou para atualizar as regras para o uso de bens como garantia em negociações e permitir que a oferta por empréstimos aumente, reduzindo, assim, as taxas de juros. O advogado empresarial João Victor Duarte Salgado, que integra o escritório Celso Cândido de Souza Advogados, analisa que ela poderá trazer benefícios a todos os envolvidos, especialmente para instituições bancárias, empresários que pretendem tomar crédito no mercado, credores e até devedores. “A princípio, a atualização é vista com bons olhos por todos”.
Vale lembrar que o financiamento é uma maneira de adquirir bens e pagar em médio e longo prazo, com o acréscimo de taxas e juros. Nesse tipo de contrato, na maioria das vezes, o próprio bem financiado é dado em garantia para que, caso ele não seja quitado, a instituição financeira possa utilizá-lo para liquidar a dívida. “Com o Marco Legal das Garantias, será mais fácil de garantir o cumprimento das obrigações, os custos serão minorados, facilitando a contratação e diminuindo as taxas de juros”, pontua o especialista.
Uma novidade da lei nesse sentido é a subalienação fiduciária, que é a possibilidade de dar o mesmo bem em garantia fiduciária. Enquanto atualmente é possível que apenas uma dívida seja garantida por alienação fiduciária, o Marco Legal das Garantias possibilita que mais de uma dívida seja garantida pelo mesmo bem em alienação fiduciária, podendo ser automóvel ou um imóvel, por exemplo, dentro do limite de seu valor.
“A alienação fiduciária é uma modalidade de garantia onde o bem fica ao credor, enquanto o devedor permanece unicamente em sua posse. O grande trunfo do Marco Legal das Garantias é autorizar que os credores, podendo, inclusive, ser mais de um credor, possam receber o bem em alienação fiduciária por mais de uma dívida. Por exemplo, com um bem de R$ 200 mil, eu posso contrair duas dívidas de R$ 100 mil cada, com dois credores diferentes, em duas modalidades de contratação diferentes, estipulando taxas de juros e periodicidade diferentes. Assim, a primeira dívida fica com a garantia da alienação fiduciária e a segunda fica com a garantia da subalienação fiduciária. Essa ordem é definida pelo tempo da contratação da dívida”, explica.
Polêmica Mesmo bem recebida, a legislação tem um ponto polêmico, que é sobre a tomada de veículos sem autorização da Justiça. Contudo, João Victor Duarte Salgado destaca como é a prática dessa questão. “Apesar de falar ‘sem autorização da justiça’, isso não ocorrerá. O Marco Legal das Garantias autorizou que os Cartórios de Registro, Títulos e Documentos possam realizar a busca e apreensão dos veículos, cujo pagamento das parcelas estejam em atraso, realizando tudo de forma extrajudicial, visando, sobretudo, a retomada do patrimônio pelo credor. Com isso, fica autorizado ao Oficial do Cartório expedir mandado, diligenciar em busca do bem, removê-lo e entregar ao credor”.
O advogado pontua que essa novidade foi bem vista pelos retentores das dívidas. “É bom para o credor em razão da desnecessidade de judicialização para retomada do bem, diminuindo os custos e otimizando o tempo. E aos devedores, por mais que soa inicialmente prejudicial, minimiza as despesas a serem pagas que, todo mundo sabe, no final, sai do bolso do devedor”, afirma. No entanto, ele salienta que a intervenção da Justiça ainda pode acontecer. “Na eventualidade de questionar-se a relação, especialmente cobrança de valores excessivos, pagamentos realizados e não considerados, ou solicitar prestação de contas ao credor, por exemplo, ainda é de competência do Poder Judiciário, que intervém para regular a relação entre credor e devedor”.
Prática João Victor Duarte comenta outra inovação do Marco das Garantias: o agente de garantias. “Apesar da lei trazer uma clareza sobre o que ele fará, ainda não ficou bem definido como acontecerá na prática. O que se sabe é que ele é o responsável por gerenciar as garantias, especialmente nos casos de subalienação fiduciária, acreditando-se que essa figura atuará com certa limitação geográfica, acompanhando os pagamentos das parcelas, o cumprimento da retomada do bem, a amortização antecipada e etc. Essa figura, em razão do estrito interesse, não poderá ser o credor (especialmente os bancos) ou devedor”.
Na prática, o especialista pontua que a legislação ainda não está sendo aplicada. “Estima-se que ela demorará um bom tempo para que seja, então, aplicada pelas instituições bancárias. A título de exemplo, a Lei de Alienação Fiduciária (9.514) é de 1997 e somente a partir de 2005 é que ela veio efetivamente a ser aplicada nas contratações de empréstimo bancário”, exemplifica o advogado.