Pesam sob os ombros do petista declarações relacionadas ao controle da mídia e o agronegócio. Como se não bastasse, ex-presidente também tem se esquivado dos debates e evitado falar sobre indicações em um eventual novo governo
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) briga incansavelmente para chegar, de novo, ao posto máximo da política brasileira. O petista tem o desafio de destituir o projeto de reeleição encabeçado pelo atual presidente, Jair Bolsonaro (PL). A briga entre ambos terá um ponto final, ao menos do ponto de vista legal, no próximo domingo, dia 30, quando disputarão o segundo turno das eleições de 2022. Nunca antes o cenário foi tão polarizado.
A avaliação, nos bastidores da política nacional, é de que os últimos dias, em especial os últimos 20, têm sido pautados por uma “virada” de votos em favor do atual presidente. Se essa virada será suficiente para enterrar de vez o projeto petista rumo ao poder, o domingo dirá. Porém, se a eleição fosse hoje, boa parte dos grandes players da política não hesitam em afirmar que Bolsonaro levaria a melhor.
A maioria justifica a afirmação com base, principalmente, nas derrapadas do ex-presidente que não conseguiu se sustentar com uma margem gordurosa de vantagem em relação ao adversário. Houve um derretimento em função de falas específicas e também pelo tímido aproveitamento dos debates.
Debates
No dia 29 de outubro, por exemplo, Lula esteve no debate realizado pela TV Globo. Às vésperas do primeiro turno, o petista não foi tão bem quanto o núcleo duro do PT esperava. Poucos atestam isso. Em off, porém, alguns não hesitam em dizer que Lula ‘pecou’ ao cair na pilha do Padre Kelmon, candidato pelo PTB, por exemplo.
Ainda que o ex-presidente tenha sido orientado a evitar desgastes desnecessários e focar sua participação na apresentação de soluções para o Brasil, remou no justo oposto a isso especialmente no terceiro bloco quando se limitou, basicamente, a revidar ataques.
Mais tarde, já no segundo turno, participou de outro debate, dessa vez encabeçado pela Bandeirantes, onde esteve frente a frente com Jair Bolsonaro. Dessa vez, a grande crítica se restringiu não apenas à não apresentação de soluções e propostas, como também a má administração do seu tempo em vídeo.
Como se não bastasse, Lula ainda faltou ao debate promovido pela Rede Record no último domingo (23/10). Foi a segunda vez que o petista se esquivou do mesmo encontro. Bolsonaro, na ocasião, aproveitou a ausência do adversário para nadar de braçada em uma inserção gratuita de mais de uma hora em rede nacional.
Agro
Lula também enfrentou alguns desgastes ao longo dos últimos meses que podem custar caro em 30 de outubro. A começar pelos deslizes cometidos com o agronegócio, um segmento importante que se mostrou incalculvelmente mais forte nos últimos anos, especialmente no meio político.
Acontece que o ex-presidente chegou a declarar publicamente que o setor não é adepto ao petismo por saber que, se ele for eleito, não haverá mais desmatamento. “Eles sabem que vai acabar essa história de invadir a Amazônia, que vamos preservar aquele território, que não dá pra deixar invadir os biomas brasileiros. Sabem que a gente não vai deixar mais ter garimpo em terra indígenas, não via deixar mais desmatar e cortar madeira para vender de forma ilegal”, disse durante um comício em Porto Alegre (RS). E endossou em outro trecho: “o ódio que alguns (do setor) demonstram pelo PT é ideológico e não tem cura”.
Em entrevista ao jornal O HOJE, o professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e empresário rural, Ênio Fernandes, comentou o assunto. “Temos que entender que quem desmata são os criminosos, não os produtores. Os produtores são os mais responsáveis ambientalmente do mundo. Temos uma das legislações mais restritivas do mundo. Se não for a mais restritiva, está entre elas. Temos a maior área de plantio direto do mundo, a maior área de preservação nas grandes economias produtoras, o índice de produtividade só cresce, ficando muito acima do crescimento de abertura de áreas, inclusive”, argumentou.
Em outro trecho da entrevista ele reforçou que o agronegócio utiliza apenas 7% do território nacional. “O agro é extremamente responsável e tenho certeza que não existe nenhuma Nação do mundo que produz alimento respeitando o meio ambiente como o Brasil produz na escala em que se produz. O agro não deve ser associado aos desmatadores. Esses são grileiros e precisam ser punidos. Quem faz essa associação denigre um dos melhores negócios do País, denigre a mola propulsora do Brasil. Não estão, com isso, prejudicando o agro, estão prejudicando a Nação em geração de emprego, renda e impostos.
Mídia
Também pesa sob os ombros do ex-presidente as declarações relacionadas ao controle da mídia. A investida se justifica, segundo o petista, para evitar “mentiras” nas redes. Na visão dele, a regulamentação será importante para separar o “joio do trigo”. A ideia é evitar a disseminação de fake news na internet.
“As pessoas às escondidas fazem coisas que não teriam coragem de fazer pessoalmente. Então a provocação, as ofensas, as falsas denúncias, as fake news são coisas que ganharam espaço muito grande na internet”, disse em entrevista à rádio Lagoa Dourada, de Ponta Grossa, no Paraná.
Nos bastidores, a leitura é de que declarações do tipo levantam temor de controle e censura. Pesa também o fato do ex-presidente e nenhum dos integrantes de seu QG saberem explicar exatamente como tudo isso será implementado em um eventual governo esquerdista. Com isso, as falas genéricas em relação ao suposto novo marco regulatório dos meios de comunicação abriu margem para críticas dos adversários ao longo da campanha, em especial as vindas de Jair Bolsonaro, na briga pelo segundo turno.
Equipe
As dificuldades em abrir vantagem e se consagrar com uma distância segura como favorito passa também pela resistência em comentar a formação de equipes. Lula tem sido cobrado, especialmente por lideranças do setor econômico, por uma posição em relação ao seu quadro de auxiliares. O que se vê, porém, se resume a uma sequência de esquivas.
O ex-presidente disse, na última terça-feira (25/10), que só vai anunciar sua equipe depois que ganhar a eleição. “Não sento na cadeira antes de ganhar”, disparou em entrevista à rádio Nova Brasil FM. A omissão em relação aos nomes para cargos estratégicos do governo é vista nos bastidores com desconfiança. Há quem diga, inclusive, que ante as incertezas grandes players ligados ao mercado tendem a apostar em Bolsonaro.
Questionado justamente sobre a possibilidade de prejuízo, o petista disparou: “”Eu não estou para agradar o eleitor desconfiado. Se eu anunciar uma equipe econômica, se eu tiver dois economistas, eu vou perder 10, vou perder 15. Ou seja, eu não quero perder voto. As pessoas sabem, eu já fui presidente, eu não indiquei ministério antes”, pontuou Lula.
As declarações têm sido interpretadas como um novo tiro no pé. Sem contar tudo o que já foi dito em relação ao elogio a ditaduras e reforma trabalhista. Assuntos que ampliaram, por exemplo, a desconfiança em relação a um novo governo encabeçado por Lula, bem como deram munição ao seu principal adversário.
Fonte: O HOJE