Galeno fez o retrato para Neusa, que deu de presente para Nelson, que emprestou para Genserico, que mostrou para Alexandre, que postou nas redes sociais. A fotografia antiga, compartilhada diversas vezes no Facebook nesta semana, foi um dos recursos que serviu de base para a escultura do Monumento às Três Raças, na década de 1960, e mostra que a autora, a artista plástica Neusa Moraes, usou diversos modelos humanos para conceber sua obra.
Seis homens identificados, pelo menos, foram documentados em imagens que ficaram para a posteridade, três deles cujas identidades ganham notoriedade agora com a repercussão digital de uma das fotos: Antônio Gonçalves, Nilton Ribeiro dos Santos e Adejar Gonçalves. Os nomes estão anotados no verso da imagem que, não à toa, despertou curiosidade entre internautas.
O caminho que a imagem percorreu até despertar curiosidade no perfil Goiânia Antiga, no Facebook, foi longo. No início dos anos 1960, a pedido do Rotary Club Internacional, Neusa, cuja morte completa 15 anos em fevereiro, começou a trabalhar na escultura em homenagem aos trabalhadores anônimos que ajudaram a construir Goiânia. Ainda na fase de concepção do trabalho que depois se tornaria um dos cartões-postais da cidade, Neusa pediu a Galeno Martins de Araújo para fazer fotos que serviriam de inspiração à escultura.
[caption id="attachment_14260" align="alignleft" width="220"]Galeno, fotógrafo respeitado da época, e nome por trás do então renomado estúdio Foto Martins, por anos localizado na Rua 7, no Centro, registrou o que seria a essência do Monumento, até hoje o principal marco da Praça Cívica. Na imagem, Antônio, Nilton e Adejar representam os brancos, os negros e os indígenas que ajudaram a formar a capital. É quase certo que Galeno tenha feito várias opções de fotos para Neusa, mas somente uma, anos depois, se destacou entre as outras.
Na década de 1990, quando começou a trabalhar na obra em homenagem ao idealizador e construtor de Goiânia, Pedro Ludovico Teixeira, a artista plástica conheceu o fotógrafo Nelson Santos, para ela quem deu a imagem feita por Galeno. “Foi um presente. Como acompanhei de perto a construção do molde do cavalo (a estátua de quase 8 metros, hoje na Praça Cívica, retrata Pedro Ludovico a cavalo), e registrei o dia a dia do ateliê, na Paróquia Nossa Senhora Auxiliadora, acho que ela quis me agradar. Como um gesto de amizade”, recorda Nelson.
Tesouro descoberto
Quase 30 anos depois, já como integrante do Conselho Municipal de Cultura, o fotógrafo Nelson Santos mostrou o presente para o amigo Genserico Borges, que, com seu faro de publicitário, sentiu o cheiro de raridade e enviou a foto para Alexandre Perini, administrador da página Goiânia Antiga no Facebook. “Nossa preocupação é contribuir para a formação de uma memória afetiva da cidade. O bacana é que, falando sobre o patrimônio histórico edificado, conseguimos despertar paixões nos visitantes”, conta Perini.
Prova disso é que, até ontem, cerca de 200 pessoas já haviam compartilhado a publicação com a foto de Galeno e mais de 500 tinham reagido a ela. “Linda recordação”, escreveu um seguidor. “Baita artista. Merece nosso resgate”, postou outro, referindo-se a Neusa Moraes. “Um registro memorável”, opinou um terceiro. Entre as dezenas de interações, uma chamou atenção especial de Alexandre. Foi a do professor aposentado José Gonzaga Ribeiro, 75 anos, outro dos modelos de Neusa que posou para outra fotografia que, assim como a de Galeno, também serviu de inspiração para o esboço do Monumento às Três Raças.
Também no início da década de 1960, José, que representou o negro, posou para um fotógrafo não identificado, ao lado dos amigos José Galdino Pereira, 73 anos (branco), e João Batista Ferro, 78 anos (índio). Neusa era assim: gostava de buscar entre conhecidos inspiração para suas obras.
Os três, que frequentavam a então Escola Técnica Federal de Goiás (hoje IFG), tiveram suas identidades reveladas 35 anos depois de fazerem a famosa pose, em reportagem do POPULAR de 2003. Em 2015, a convite do jornal, os amigos visitaram a obra de restauração da Praça Cívica, lugar que nunca deixaram de percorrer desde que o monumento foi inaugurado, em 1967.