O reggaeton 'Gata' é o maior acerto de disco produzido com 'padrão internacional', mas pautado por indecisão entre atrair o público de língua hispânica e seduzir o mercado dos Estados Unidos. Capa do álbum 'Versions of me', de Anitta
Divulgação
Resenha de álbum
Título: Versions of me
Artista: Anitta
Edição: Warner Records
Cotação: * * *
♪ Enfim lançado na noite desta terça-feira, 12 de abril de 2022, o quinto álbum de estúdio de Anitta, Versions of me, apresenta ao longo de 15 faixas várias versões já conhecidas da artista carioca, mas, por isso mesmo, deixa a cantora sem identidade bem delineada.
Trilíngue como o antecessor Kisses (2019), Versions of me encadeia músicas em inglês – pronunciado com perfeição pela girl from Rio sem o sotaque que identifica estrangeiros nos Estados Unidos – e em espanhol, além de funk em português, Que rabão, aberto com a voz de Mr. Catra (1968 – 2018) e desenvolvido com o rap do norte-americano YG e o canto do MC fluminense Kevin O Chris.
Na costura do disco, Que rabão soa como mero aceno afetivo para o passado de Anitta no circuito dos bailes funks, universo ainda marginalizado pela sociedade de onde a cantora emergiu para o mundo ao jogar na rede a música Menina má em março de 2022.
Decorridos dez anos, Anitta é estrela de visibilidade internacional que mira sobretudo o mercado norte-americano com Versions of me, álbum com foco mais fechado do que Kisses, disco que culminava com flerte com a MPB em faixa gravada com Caetano Veloso.
Sob a batuta de Ryan Tedder, produtor executivo que orquestrou produção de excelente nível com o tal “padrão internacional”, Anitta apresenta disco fluente que, entre altos e baixos, peca de fato por flagrar a cantora indecisa entre dois mercados, tentando seduzir tanto o público de língua hispânica quanto o público norte-americano que fala inglês.
Para atrair os hispânicos, a isca mais certeira de Versions of me é o reggaeton Gata (Abby Keen, Anitta, Chencho Corleone, Edwin Vasquez Vega, Everton Bonner, John Taylor, Lloyd Willis, Orlando Valle e Sly Dunbar), de letra autorreferente cantada em espanhol por Anitta em gravação com o cantor porto-riquenho Chencho Corleone.
Com Dennis DJ envolvido na produção, Gata cativa mais do que Envolver (Anitta, Julio M Gonzales Tavarez, Freddy Montalvoe e José Carlos Cruz, 2021), o reggaetaon que, em efeito viral, alcançou o topo da parada global da plataforma Spotify em março e, por isso mesmo, abre o álbum Versions of me, mesmo tendo sido lançado em novembro.
Na mesma linha, em gravação com feita com o DJ, cantor e compositor britânico Afro B, Maria elegante (Abby Keen, Anitta, Dashawn, Donny Flores, Joseph Charles, Juan Jose Arias Castaneda, Osmar Escobar, Ross-Emmanuel Bayeto e Santiago Naranjo López) tem menor poder aliciador, mas mostra que Anitta domina os códigos do mercado latino.
Anitta cita 'La bamba' em música com o rapper norte-americano Ty Dolla $ign
Marco Ovando / Divulgação
Para o mercado dos Estados Unidos, Anitta direcionou faixas como a música-título Versions of me (Anitta, Bibi Bourelly, Madison Love, Matthew James Burns e Rami Yacoub) e Love you (Anitta, John Hill, Mike Sabath e Rachel Keen). Ambas as faixas seguem a cartilha do pop norte-americano sintetizado com batidas mais ou menos eletrônicas.
Só que, em que pese a produção invariavelmente bem orquestrada, o álbum Versions of me muitas vezes soa genérico como produto industrializado. Até o romantismo sensual do R&B pop Ur baby (Anitta, Eyelar, Greg Aldae, James Murray, Khalid, Lonnie Liston Smith e Mustafa Omer), gravado por Anitta com o cantor norte-americano Khalid, parece fabricado em linha industrial.
Faltam emoções reais até quando Anitta tenta soar vulnerável como na balada Love me, love me (Anitta, Carolina Colón Juarbe e Charlie Handsome). Contudo, é claro que, em mercado de alta voltagem erótica como o da música pop do século XXI, I'd rather have sex (Ben Free, Julian Bunetta, Marco Borrero, Sherwyn Nichols e Tia Scola) conquistará seguidores.
Já Turn it up (Andres Torres, Anitta, Lourdiz, Maurico Rengifo, Ryan Tedder) concilia idiomas – começa em inglês, mas embute versos em espanhol – e batidas em gravação que reitera as indecisões de álbum que joga funk, reggaeton, rock emo (Boys don't cry), trap, rap e pop em caldeirão que ferve menos do que se supõe.
Por ter 15 faixas, Versions of me acaba soando inevitavelmente oscilante. O disco até consegue se equilibrar entre temas já conhecidos como o funk melody Faking love (Andres Torres, Anitta, Kaine, Mauricio Rengifo, Ryan Tedder e Saweetie, 2021) e surpresas como a citação de La bamba – tema tradicional mexicano apresentado em 1958 com letra de Ritchie Vallens (1949 – 1959) – em Gimme your number (Abby Keen, Alexander Izquierdo, Daecolm Holland, Patrizio Pigliapoco e Ty Dolla $ign), faixa gravada com o rapper norte-americano Ty Dolla $ign.
A questão é que, entre acertos e faixas genéricas, Versions of me se impõe mais pela produção realmente azeitada do que pela essência do repertório. Com mais versatilidade do que identidade nesse quinto álbum de estúdio, Anitta ainda precisa encontrar a melhor versão de si mesma para se consolidar definitivamente no top global.
Fonte: https://g1.globo.com/pop-arte/musica/blog/mauro-ferreira/post/2022/04/12/anitta-soa-sem-identidade-no-album-versions-of-me.ghtml